“Ocupa e resiste”: 15 anos do movimento que derrubou reitor da UnB


O clima de revolta dos estudantes da Universidade de Brasília (UnB) era incontestável na manhã de 3 de abril de 2008. Em janeiro daquele ano, o reitor Timothy Martin Mulholland havia sido denunciado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) sob a alegação de usar recursos do Fundo de Apoio Institucional à Universidade de Brasília para adquirir um luxuoso carro e decorar o imóvel funcional em que morava na época, na Asa Norte. A situação mais emblemática foi a compra das chamadas “lixeiras de ouro”. O apelido áurico é devido ao fato de que a peça custava R$ 1.000.

Quando a denúncia surgiu, os alunos estavam em período de férias, mas o novo Diretório Central dos Estudantes (DCE), formado pela chapa Nada Será como Antes – eleita em novembro do ano anterior com 1.910 dos 4.148 votos –, seguiu pelos próximos meses atiçando os ânimos do corpo estudantil. Novas acusações começaram a surgir, o que não deixou a poeira baixar. Os dirigentes da instituição eram apontados em casos que envolviam recursos de fundações, especialmente da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec), que deveriam ser destinados a pesquisas, mas estavam sendo desviados para a aquisição de bens de luxo, em suposto esquema.

Em 12 de março, alunos fizeram a primeira manifestação contra o reitor. A passeata seguiu até o gabinete do dirigente máximo da UnB, mas os jovens não foram recebidos por ele. Timothy não tinha uma boa relação com os discentes, e o clima esquentava a cada dia. Em 3 de abril, a assembleia estudantil marcada para aquela quinta-feira, às 12h, na Ala Norte do Instituto Central de Ciências (ICC) – também conhecido como Minhocão –, teria um desfecho diferente.

Carregando um caixão e com cartazes exigindo a demissão de Timothy, cerca de 100 estudantes caminharam por 600 metros do local da assembleia até o prédio da reitoria. Ao subirem as rampas projetadas por Oscar Niemeyer ainda no processo de construção de Brasília, os manifestantes identificaram fragilidade na segurança e decidiram ocupar o edifício.

“Quando a gente ocupou, ficou todo mundo meio perplexo, sem saber o que aconteceria até então. E aí um aluno, um calouro da medicina, perguntou: ‘E agora, o que a gente faz?’. Foi o momento em que eu subi numa cadeira e falei: ‘Bom, galera, agora a gente fica aqui e só sai quando o reitor sair’”, lembrou Luiza Oliveira, uma das manifestantes mais ativas na ocupação. Aos 18 anos, a jovem tinha cabelo vermelho e estava no 5º semestre do curso de ciências sociais. Atualmente, aos 34 anos, ela é professora de sociologia da Secretaria de Educação do Distrito Federal.

A ocupação durou 15 dias e resultou no afastamento do reitor, do vice-reitor e dos dirigentes da instituição. A nova eleição teve voto paritário pela primeira vez, e tantos os votos dos estudantes quanto os dos professores tiveram o mesmo peso. O Ministério da Educação e o Ministério de Ciência e Tecnologia mudaram as regras para liberar recursos às fundações educacionais em todo o país. Ainda durante a ocupação, a Portaria Interministerial MEC/MCT nº 475, de 14 de abril de 2008, exigiu mais transparência dos repasses. Com a desocupação em 18 de abril, como o nome da chapa já adiantava: nada mais foi como antes.

Após 15 anos da marcante data, o Metrópoles conversou com os principais personagens da ocupação, teve acesso às 246 páginas do processo movido pela universidade para remover os estudantes – que tramitou na 17ª Vara Federal –, revisitou as matérias disponíveis no Centro de Documentação (Cedoc) do Jornal de Brasília e fez contatos com jornalistas que acamparam “junto” aos estudantes no prédio da reitoria à espera de um desfecho da história de um dia que durou uma quinzena.



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